Após um 2024 marcado pela alta, com o dólar atingindo R$ 6,30, a moeda americana iniciou 2025 em trajetória de queda, recuando mais de 6% e operando abaixo de R$ 5,80. Esse movimento de valorização do real, no entanto, pode enfrentar obstáculos. Analistas alertam para um cenário global incerto e desafios internos que podem limitar a continuidade da apreciação da moeda brasileira.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Resumo rápido gerado automaticamente
O ambiente externo, marcado por temores de uma desaceleração na economia dos EUA em decorrência de tensões comerciais, somado ao ressurgimento de ruídos políticos e fiscais no Brasil, podem conter o otimismo em relação ao real. Além disso, persistem dúvidas sobre o fluxo cambial, mesmo com o início da safra agrícola, e a sustentabilidade do desmonte de posições compradas em dólar por investidores estrangeiros.
A trajetória de queda do dólar no primeiro trimestre de 2025 foi impulsionada, principalmente, por fatores externos. A postura menos agressiva do governo Trump em relação às tarifas comerciais, em comparação com as expectativas anteriores, contribuiu para esse cenário. Adicionalmente, a tese do excepcionalismo americano foi questionada pelo desempenho abaixo do esperado das “big techs”, em contraposição à ascensão da empresa chinesa de inteligência artificial DeepSeek.
Conforme Gustavo Menezes, gestor de macro da AZ Quest, “o excepcionalismo americano era um consenso no fim do ano passado. Mas a percepção dos investidores mudou, levando moedas emergentes e o euro a performarem bem neste início de ano”. O especialista acrescenta que medidas de estímulo na China e o pacote fiscal na Europa, com ampliação de gastos militares, também influenciaram essa mudança.
Contudo, a continuidade dessa diversificação de carteiras é incerta. Moedas emergentes, como o real, podem ser impactadas por um aumento na aversão ao risco e pela busca por segurança, caso as tensões comerciais resultem em uma desaceleração acentuada ou até mesmo em recessão nos Estados Unidos. Um sinal de alerta já surgiu com a reação negativa de divisas latino-americanas diante da expectativa pelas tarifas recíprocas anunciadas pelo governo Trump.
Apesar do cenário de incertezas, Adauto Lima, economista-chefe da Western Asset, pondera: “Se a sensação for de que as tarifas não vão trazer uma piora muito forte da atividade, principalmente global, as divisas emergentes e o real podem continuar se apreciado. Mas, por enquanto, a incerteza é muito grande, e vemos uma pausa nesse movimento de queda do dólar por aqui”.
No primeiro trimestre, observou-se um movimento global de desmonte de posições em dólar e uma queda nas bolsas de Nova York, com investidores buscando ativos considerados descontados. Dados da B3 revelam que investidores não residentes reduziram em mais de US$ 30 bilhões a posição comprada em dólar por meio de derivativos cambiais desde o final do ano anterior.
Essa redução contribuiu para a valorização do real, mesmo diante de uma saída de dólares do país. Dados do Banco Central até meados de março indicam um fluxo total negativo em mais de US$ 10 bilhões em 2025, com uma saída líquida superior a US$ 13 bilhões no segmento financeiro. As entradas no lado comercial ficaram abaixo do volume tradicional para o período.
Ainda pairam dúvidas sobre a continuidade do desmonte de posições em dólar e a recuperação do fluxo cambial, o que pode limitar apostas mais significativas na apreciação do real. Segundo Menezes, da AZ Quest, “a expectativa é que o saldo comercial e o fluxo como um todo comecem a se recuperar por conta da exportação da safra”. No entanto, ele ressalta a incerteza sobre o nível de internalização de recursos por parte dos exportadores.
Adicionalmente, o cenário para a moeda brasileira é complexo devido ao retorno de ruídos políticos e fiscais. Questionamentos sobre a neutralidade fiscal da reforma da renda e desconforto com medidas consideradas populistas, como a liberação de saldo do FGTS e o novo crédito consignado privado, também pesam sobre o mercado.
Daniel Miraglia, economista-chefe do Integral Group, avalia que os ativos brasileiros estavam muito “descontados” no fim do ano passado e se recuperaram sem uma melhora dos fundamentos do país. Ele alerta que “o real e a própria bolsa não estão agora tão atraentes” e que investidores devem se tornar mais sensíveis ao noticiário político e fiscal.
Luciano Costa, economista-chefe da corretora Monte Bravo, compartilha dessa visão e afirma: “Já começamos ver um impacto no comportamento do dólar por conta da questão fiscal em alguns pregões. Isso aconteceu com o anúncio de medidas como a liberação do FGTS e com a aprovação do Orçamento de 2025, que traz previsões muito otimistas de arrecadação para garantir as metas de resultado primário”. Costa projeta o dólar retornando ao nível de R$ 6,00 até o fim do ano.
Menezes, da AZ Quest, reconhece a relevância das questões política e fiscal, mas pondera que apostar contra o real pode ser custoso devido ao diferencial de juros. Ele observa que os sinais recentes do Banco Central indicam a continuidade do ciclo de aperto monetário, com a taxa Selic podendo atingir 15% por um período prolongado, o que traz certa proteção ao real, embora ele mantenha uma postura neutra em relação à moeda devido às muitas incertezas.
Fonte: http://www.cnnbrasil.com.br